Treinador Manuel Machado escreve sobre Álvaro Pacheco

 


Manuel Machado, antigo treinador do Vitória SC, do Nacional e do Moreirense entre outros clubes, escreveu hoje no jornal Desportivo de Guimarães o artigo que se segue subordinado ao tema "Álvaro Pacheco" e que aqui publicamos com a devida autorização do diretor daquele semanário vimaranense, Abel Sousa.

DESPORTIVO 20 DEZEMBRO 2022

Titulo: ÁLVARO PACHECO

Encontrando-me no centro da simpática cidade de Vizela que visitei por motivos pessoais e na proximidade do seu belo  parque assaltaram-me memórias de duas décadas quando ao serviço do Moreirense FC, esse espaço, por deferência de seu proprietário, nos ser- viu inúmeras vezes de local de treino em tempos em que só a criatividade e espirito de sacrificio permitiram que, com tão pouco, se tivesse feito tanto. Gratificante foi constatar que, apesar de a época do ano não ser a mais fa- vorável, continua a distinguir-se como um recanto onde a natureza manda e convida a que se desfrute daquela tranquilidade que a linha de água nos transmitem, embora tantas vezes ofendida pelo desrespeito ambiental.

Fazendo horas para o compromisso aprazado entrei num estabelecimento comercial das imediações para o habitual café matinal, constatando de imediato que o tema de conversa das pessoas presentes, dava pelo nome de Alvaro Pacheco, sendo evidente o tom de reprovação e mesmo de indignação que gerou o seu despedimento do comando técnico da principal equipa do concelho.

A era da informação que se vive, caraterizada pela popularização da internet e as novas ferramentas tec- nológicas facilitaram a possibilidade da expressão de opinião a quantos decidam fazê-lo. No que reporta a este assunto, fácil será encontrar nas redes sociais centenas de comentários globalmente reprovadores da decisão em si mesma e de quem decidiu.

Tal facto não seria sequer assunto dado que a multiplicação destas situações no futebol é uma constante com as quais a generalidade dos amantes da modalidade está habituada a conviver. Mas, neste caso em apreço e tendo em conta a excelência do trabalho e o rendimento desportivo obtidos pelo treinador em causa, bem como pela sua compostura.

Natural é, pois, a especulação e tentativa de racionalizar e encontrar motivos e razões que, de algum modo, sustentem e expliquem o acontecido. A acreditar na versão mais corrente tal estará relacionado com a vontade do novo proprietário da S.A.D. azul de fazer voltar ao comando técnico do F. C. Vizela, a partir do próximo mês de Janeiro, um treinador por si represen- tado e com ligação ainda recente ao mesmo, sendo assim transitória a contratação de Tulipa. 

Este episódio, em si frequente, gerou descontentamento nos adeptos e levou à invasão das instalações e perturbação dos trabalhos da equipa, o que obviamente não subscrevemos e que ilustra com clareza a sua difculdade em compreender e aceitar as mudanças e transformações que em ritmo acelerado, o futebol vem sofrendo.

Já aqui abordamos um vasto conjunto de aspetos que na atualidade diferenciam a Futebol Associativo do passado, do agora chamado Futebol Indústria entre eles referimos a perda do poder decisório do sócio no contexto de venda a privados da maioria do capital das S.A.Ds dos clu bes, transferindo para estes, a gestão da área do futebol profissional que, independentemente da grandeza e heterogeneidade do clube é, desde sempre, a mais importante.

O eterno conflito entre o velho e o novo que, geração após geração provoca a mudança e a evolução, resultará sempre num preço a pagar. Todos sabemos que, como tantas vezes ocorre, para edificar património há necessidade de destruir património. Assim vai sucedendo bastando: pensarmos no que acontece de cada vez que se constrói uma barragem ou mais recentemente na contestação. pelos residentes locais, à exploração do lítio que poderemos contestar ou admitir prende-se com o rumo que se segue: No caso do futebol, apesar da indiscutivel e generalizada melhoria das condições que transversalmente, o atingem, da verdade maior que as tecnologias proporcionam, o consenso é uma miragem.

Citaria a Senhora Procuradora Maria Candida Almeida, ex-diretora do D.C.L.A.P. que em artigo de opinião no Jornal de Notícias, escrevia dias atras "É tempo de futebol de paixões exacerbados, atitudes histéricas, disfunções nos convivios familiares, relatos continuos nas diversas estações de rádio, olhos fixos nas televisões acompanhando as transmissões do Mundial. Não haveria problema, se todos estivessem conscientes de que o futebol já não é um desporto, mas uma indústria em cujos corredores se multiplicam milhares de milhões de dólares/euros: se todos nós nos lembrassemos que a cada pontapé na bola se movimentam fortunas escandalosas, enquanto algures no Mundo uma criança descalça e seminua dá um chuto numa bola de trapos, ansiando por um bocado de pão..."

É pois, sobre o caminho que a modalidade vem percorrendo que, todos quantos por ela são apaixonados, devem refletir no sentido do ganho de consciência desta realidade transformadora e da importância que ela de- verá ter, ou não, nas suas vidas.

O mundo do Futebol vive um momento muito perigoso. Este desporto que é hoje um fenómeno universal e cuja história tem transformado positivamente a sociedade moderna em todas as âmbitos que queiramos considerar, desde o económico ao social se não corrigir a sua trajetória, pode, de repente, implodir face aos sinais cada vez mais fortes de intrusão de movimentos financeiros, quase sempre desconhecidos, e, muitas vezes, eventualmente roçando a ilegalidade.

Caberá às autoridades entender o problema e atalhar caminho para evitar um desastre que pode dizer-se prenunciádo.

MANUEL MACHADO 

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