Queridos cristãos da Comunidade Paroquial do Divino Salvador de Joane, Pax! «Se um membro sofre, todos os membros sofrem com ele; se um membro é honrado, todos os membros se alegram com ele» (1 Cor. 12, 26).
A Paróquia do Divino Salvador de Joane é uma comunidade muito amada pela Arquidiocese, com um percurso e uma história de fé admirável e que muito honra a Igreja que está em Braga. Dela saíram muitas vocações sacerdotais, religiosas e missionárias, catequistas e jovens cheios de entusiasmo e também muitos adultos maduros e empenhados na missão da Igreja.
Por isso, foi com profunda tristeza e imensa dor que recebi a notícia de que alguns membros da comunidade estão a sofrer e que o seu sofrimento chegou aos meios de comunicação social, através da denúncia de abusos cometidos durante a celebração do Sacramento da Reconciliação.
Às vítimas e a toda a comunidade paroquial, que se sente provada na fé e escandalizada, desejo manifestar o meu carinho e a minha proximidade e pedir humildemente perdão.
Sei que a comunidade paroquial tem sido sujeita a uma forte exposição mediática. Embora difícil, esta experiência pode contribuir para o aprofundamento de um processo de purificação que estamos ainda a iniciar. É preciso reconhecer que, neste caso, a Igreja falhou no seu dever de proteger os mais frágeis e vulneráveis. Desejo criar as condições para que todas as vítimas possam ser acolhidas, escutadas e acompanhadas.
Quero ser transparente convosco e dar conta dos passos que até agora foram dados para se apurar a verdade e acolher as vítimas: – Em 21 de novembro de 2019, chegou à Comissão de Proteção de Menores e Adultos Vulneráveis da Arquidiocese de Braga (CPMAV) uma denúncia por parte de uma vítima, relatando ter sofrido abuso sexual por parte do referido sacerdote.
Esta vítima mencionou a existência de outras vítimas. Dentro dos limites das suas competências, a Comissão diligenciou no sentido de identificar estas e outras possíveis vítimas, mas sem sucesso.
Dois anos mais tarde, chegou à Comissão mais uma denúncia. Ambas as vítimas foram acolhidas e acompanhadas pela CPMAV.
Confrontamo-nos, agora, com o elevado número de casos relatados pela Comunicação Social. – Tendo a CPMAV enviado os relatórios relativos às duas denúncias à autoridade eclesiástica competente, o então Arcebispo de Braga criou, em janeiro de 2022, uma Comissão de Investigação Prévia, em conformidade com as normativas eclesiásticas à data em vigor.
Em maio de 2022, o atual Arcebispo de Braga enviou todos os elementos recolhidos para o Dicastério para a Doutrina da Fé. – Por fim, em sintonia com o mesmo Dicastério, em julho de 2022, foram impostas medidas disciplinares ao sacerdote em causa, a saber a necessidade de se abster de exercer publicamente o seu ministério sacerdotal e, de modo particular, a celebração pública dos Sacramentos da Eucaristia e da Reconciliação, devendo recolher-se num clima de oração, reflexão e penitência. Reconheço que não conseguimos ser mais céleres no tratamento das denúncias e mais eficazes no acompanhamento das vítimas, o que lamento profundamente.
No entanto, estamos ainda a caminho e quero dizer-vos que darei todos os passos necessários no sentido de promover um processo de cura e reconciliação. Neste sentido, já pedi à Comissão de Proteção de Menores e Adultos Vulneráveis da Arquidiocese de Braga a criação de um Serviço de Escuta destinado a todos quantos desejem partilhar as suas experiências.
Este serviço estará disponível na Paróquia de Joane de forma presencial, sendo ainda possível recorrer ao mesmo por via telefónica ou por correio eletrónico. Recordo que a Comissão de Proteção de Menores e Adultos Vulneráveis está disponível para acolher e acompanhar todos os que possam ter sido vítimas de qualquer espécie de abuso sexual em alguma paróquia ou instituição da Arquidiocese de Braga.
Peço veementemente a todos os que possam ter conhecimento de situações de abuso que façam chegar o seu testemunho à Comissão (comissao.menores@arquidiocese-braga.pt ou 913 596 668). Sei que é doloroso recordar e partilhar experiências de abuso, mas este é um passo indispensável no processo de cura e apuramento da verdade.
Neste momento difícil da vida da Igreja em Portugal, quero reafirmar a palavra de esperança que dirigi a toda a Arquidiocese na minha primeira carta pastoral: «Ele, Bom Samaritano, continua a gerar e a acompanhar a Sua Igreja».
Confio que o processo de purificação que estamos a iniciar abrirá para a Igreja um novo futuro, marcado pelo reconhecimento humilde e transparente dos seus erros e pecados, pelo acolhimento das vítimas e pela criação de uma cultura de prevenção e cuidado. O Papa Francisco convoca-nos a uma conversão pessoal, pastoral e missionária! Este é o caminho que queremos percorrer.
Por último, desejo expressar a cada um de vós a mais profunda gratidão pelo modo como continuais a participar na vida da Paróquia, apesar de tudo o que aconteceu.
Queridas irmãs, queridos irmãos, neste momento quero dirigir a cada um de vós a exortação de S. Paulo a Timóteo: «Não te envergonhes de dar testemunho de Nosso Senhor» (2 Tim 1). Não tenhamos vergonha de pertencer à Igreja. Conhecemos as imperfeições dos seus membros, mas amamo-la como mãe. Este é o tempo da fidelidade. Permaneçamos firmes na fé, abertos ao dom do Espírito, o único que pode curar todas as feridas e fazer novas todas as coisas.
Esta é a hora de implorar com os Apóstolos: «Senhor, aumentai a nossa fé!» (Lc 17, 5). Como nos diz S. Paulo, sejamos alegres na esperança, pacientes na tribulação e perseverantes na oração (Rm. 12, 12). Queridas irmãs e queridos irmãos: peregrino convosco.
Juntos, somos Igreja sinodal samaritana e não esqueçamos que onde há amor verdadeiro, aí habita Deus. Peço para todos a bênção e a proteção maternal de Maria, nossa Mãe e Mãe da Igreja. Abraço muito cordial,
† José Cordeiro, Arcebispo Primaz
(Foto Diário de Trás os Montes)