António Moniz escreve-nos sobre Ribeiro Telles


Do ex-deputado e grande Amigo de Vizela, Dr. António Moniz, recebemos importante artigo sobre Ribeiro Telles, outro grande amigo de Vizela, desaparecido esta semana, agradecendo o texto ao autor e ao eng. Adelino Campante a diligência efetuada.

"Ribeiro Telles, um escudo protector dos activistas políticos que, no Parlamento, lutaram pela Restauração do Concelho de Vizela" 

Ribeiro Telles
Gonçalo Ribeiro Telles o chefe do então PPM que, desassombradamente e contra todos os interesses mesquinhos particulares, não parou enquanto não viu criado o Concelho de Vizela, satisfazendo os legitimamente anseios de toda uma população. 


Na altura da partida deste Mundo deste grande defensor da Natureza, da Ruralidade e das Populações do Interior, não posso deixar de recordar uma reunião havida no Parlamento, presidida pelo Primeiro Ministro, Francisco Pinto Balsemão e onde igualmente se encontravam os membros do Governo da AD, Gonçalo Ribeiro Telles e Freitas do Amaral, além de alguns deputados do PSD e do CDS, dos círculos do Minho, e de António Borges de Carvalho e Luís Coimbra do PPM, além da minha pessoa. Demonstrando não ter qualquer respeito pelo Primeiro Ministro, Freitas do Amaral iniciou ele próprio, abusivamente, a reunião, interpelando-me directamente, com ar ameaçador, declarando com voz alterada e um ar autoritário, que não toleraria a criação do Concelho de Vizela, acrescentando pomposamente que se eu me atrevesse a continuar com o processo, teria que passar por cima do seu cadáver. 

19 março 1998

Ficou tudo transido de espanto e de falsos receios. Claro que respondi pronta e claramente que arregaçaria as calças para não me sujar e passaria por cima da sua pessoa. Estava tudo dito. O Dr. Francisco Balsemão interrompeu a sessão antes que o ambiente se deteriorasse mais. Fiquei aflito por ter tido aquela resposta à frente de Ribeiro Telles. Este, com o seu ar sereno, foi segredando que um defensor do Municipalismo não podia ter dado outra resposta àquele Senhor!!! E o problema morreu por ali. 

Ribeiro Telles não deu um passo atrás e protegeu a actuação dos seus deputados. Além, das suas qualidades brilhantes, não podia deixar de recordar esta significativa passagem na luta pela autonomia municipal de Vizela. Homens existem que fisicamente deviam ser eternos. Contudo, espiritualmente, sempre ficam na história, pois a sua obra na defesa da Natureza, não morrerá jamais. 

Estava muito à frente do seu tempo e a politicagem mesquinha não entendia as suas ideias e os seus sonhos. Porém, hoje em dia, associaram, a sua linguagem aos seus discursos, sinal de que o seu ideário político não morreu. O “ Jardineiro de Deus”, como lhe chamava Eduardo Lourenço pelos seus espectaculares projectos de jardinagem, onde se incluíam os jardins da Fundação Calouste Gulbenkian. Recebeu o prémio Sir Geoffrey Jellicoe, o maior galardão de arquitectura paisagista do Mundo. 

A criação da Reserva Agrícola e da Reserva Ecológica Nacional, instrumentos de gestão territorial que foram um firme obstáculo à construção desordenada galopante para a qual o Estado não tinha modo de controlar. Foram delimitados espaços com solo arável e com interesse ecológico e ainda espaços expostos a riscos naturais, tais como cheias e derrocadas, para impedir desse modo a construção de edifícios novos em locais errados, embora com excelentes vistas e, por consequência mais caros. O desastre provocado pelas construções em cima das Ribeiras da Madeira foi sintomático. Tal desgraça vitimou cerca de cinco dezenas de infelizes habitantes das casas que foram arrastadas encosta abaixo pelas águas da tempestade. O PPM criticou veementemente tais construções. Mas, infelizmente, só lhe deram razão quando já nada havia a fazer. 

O Ordenamento do Território foi outro projecto do Sábio da Natureza Portuguesa. Tinha uma visão ambiental humanista, deixando um valiosíssimo legado paisagístico e político à colectividade portuguesa. Significativo o seu projecto, felizmente concretizado, do Corredor Verde de Monsanto e da Estrutura Ecológica de Lisboa. Um dos problemas da situação portuguesa que tentou solucionar, foi o facto do desenvolvimento estar a provocar flagrantes e terríveis assimetrias entre as colectividades do Litoral e do Interior. Igualmente, a sua tomada de posição em relação ao Povo de Timor foi paradigmática. Enviou Barrilaro Ruas, o decano dos nossos deputados, para a Secção do Parlamento, relativa a Timor, perante o desinteresse dos outros partidos, que só mais tarde tomaram o comboio da Luta pela Liberdade de Timor, já em pleno andamento. A Criação do Ministério do Mar, que igualmente se deve, à sua persistência na defesa necessária da nossa Zona Económica Exclusiva, que foi um elemento essencial no êxito do Governo AD.

O projecto da criação de um Subsídio para a Agricultura de Montanha não teve acolhimento em alguns países do Mercado Comum que antes preferiam invadir o nosso mercado com os seus excessos de produção agrícola. A memória do defensor da Natureza será imorredoira. 

Na verdade, as suas ideias e projectos transformaram-no numa das personalidades mais brilhante do Século XX., que o Povo Português não esquecerá jamais.

Deus tenha Gonçalo Ribeiro Telles junto a Si.

 António Moniz Palme, 10 de Novembro de 2020

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