Elisa Alice Freitas Torres, nasceu na freguesia do Ameal, concelho de Coimbra, freguesia extinta em 2013, no âmbito da reforma administrativa, conforme o disposto na lei nº 11/2013 de 28 de Janeiro (Reorganização Administrativa do Território das Freguesias), sendo o seu território integrado na União das Freguesias de Taveiro, Ameal e Arzila, com sede em Taveiro.
Foi a 2 de Julho de 1876, nesta pequena freguesia Coimbrã, antes conhecida como Amial do Campo, que nasceu a estremecida e idolatrada filha do ilustre médico hidrologista vizelense, Dr. Abílio da Costa Torres e de D. Elisa Augusta da Rocha Freitas. Logo após a formatura do seu ilustre pai, muito jovem ainda, veio para Vizela, onde os seus progenitores fixaram residência permanente.
Era filha de famílias com longa tradição intelectual, moral e religiosa, não admira, portanto, que para completa e excelente formação, tenha sido internada no Colégio Sardão, em Vila Nova de Gaia e que, segundo muitos dos bons amigos, com quem conviveu ao longo dos quase 91 anos da sua bondosa e caridosa existência, sempre recordava com viva saudade.
Era conhecida a sua perspicaz inteligência e bondade do seu coração e desde muito cedo despertara em todo o meio vizelense a mais viva das simpatias. Estava–se, então, numa era alta do termalismo vizelense e o nome do Dr. Abílio Torres, primeiro director clínico da Companhia de Banhos de Vizela, era por demais conhecido, assim como o seu grandioso e laborioso trabalho em prol das águas milagrosas de Vizela.
Isso trazia muita gente, nobre, culta e endinheirada, atraída não só pela hospitalidade das gentes da terra, do benefício das suas águas milagrosas, mas também do bucolismo e da vida cosmopolita que Vizela ostentava. De toda a parte, em poeirentas diligências, primeiro e mais tarde em fumegantes comboios da Linha de Guimarães, todos os dias chegavam magotes de gente, atraídos pela fama das borbulhantes águas termais, tendo muitos deles aqui fixado residência permanente. Naturalmente, muitos destes visitantes, eram frequentadores habituais da vida faustosa da localidade e, por vezes às escondidas, namoriscavam alegremente, com as jovens mais requisitadas da terra e assim, um dia, o jovem Augusto Luís Vieira Sores, natural de Braga, homem de elevada cultura e fino trato, frequentador habitual das Termas de Vizela, pede em casamento a mão de Elisa Alice Vieira Torres, constituindo um lar venturoso e muito feliz.
O Dr. Augusto Soares, bacharel em Direito pela Universidade de Coimbra, já referido em crónica anterior, era muito devotado à política e à diplomacia, recebendo altas condecorações e merecidos encómios, fazendo parte de vários governos, no após revolução de 5 de Outubro de 1910, ocupando por diversas vezes, cargos de extrema relevância e importância, como Procurador-Geral da República, Ministro da Justiça e Ministro dos Negócios Estrangeiros.
Foi, aliás, na qualidade de Ministro dos Negócios Estrangeiros que recebeu a declaração de guerra que a Alemanha fez a Portugal, no dia 9 de Março de 1916, por intermedio do representante da Alemanha em Portugal, o Sr. Rosen.
Porém todos estes pergaminhos, não deixava de se evidenciar pela sua, educação, simplicidade, simpatia e delicadeza que, por vezes, confundia a própria esposa. Com a sua morte a 7 de Julho de 1954, deixa a D. Elisa mergulhada em profunda dor e o seu coração não mais deixou de sentir imensa saudade do seu querido marido. Diz quem com ela privou de perto, que a D. Elisa tinha uma memória prodigiosa e habituada que estava ao convívio social, deliciava quem a ouvia narrar, as maravilhosas impressões das inúmeras e imensas viagens, com o marido missões diplomáticas ao Oriente, a África, França, Inglaterra, descrevendo com algum humor e satisfação episódios ocorridos na vida portuguesa. Era extremamente devota e acalentadora de boas e meritórias acções, estando sempre pronta a amparar e consolar quem de si se abeirasse.
Morreu esta generosa senhora a 28 de Junho de 1967 e através do seu simples e lacónico testamento, adivinhava–se, sabia–se até, por confidência particulares, os grandes desejos e anseios do seu coração generoso. Assim, quis comtemplar todas as pessoas de sua família e amigos, sem esquecer o sufrágio das almas dos seus mais queridos.
Quis também beneficiar algumas instituições de carÁcter e interesse social e religioso: Seminário Conciliar de Braga, Institutos Religiosos Paroquiais, Oficina de S. José em Guimarães, Patronato de S. João das Caldas, Hospital da Santa Casa da Misericórdia de Vizela, Real Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários de Vizela. Todavia, a obra que mais carinho despertara ao seu coração, foi um local, um asilo, destinado a albergar pessoas pobres, desamparadas, pertencentes às duas freguesias de Vizela, dando a essa grande obra de alcance social, o nome de Asilo “Torres Soares”. E foi já nas alturas do céu celeste que a D. Elisa Torres Soares, viu nascer a obra que ela tanto estremecia. Em Dezembro de 1967, é registada a Fundação Torres Soares, dando seguimento ao seu desejo testamentário. Em Junho de 1968, num gesto de profunda gratidão, viva saudade e até de justiça social, as forças vivas de Vizela e as entidades especialmente contempladas resolveram prestar condigna homenagem a tão ilustre Senhora no primeiro aniversário de seu passamento, com o programa seguinte: - às 17h00, romagem de saudade ao seu Jazigo no Cemitério da Confraria do Bom Jesus de Barrosas, freguesia de Idães, Felgueiras; às 18H30, ofícios solenes por sua alma na igreja paroquial de S. João das Caldas de Vizela, rematando com o descerramento de seu retrato no salão do Patronato de S. João das Caldas, como se pode ver num pequeno opúsculo, composto e impresso na Tipografia da Diário de Minho, em Junho de 1968, do qual respinguei uma boa parte desta crónica. As forças vivas de Vizela não esqueceram o seu generoso coração e tal como ao seu ilustre pai e grande benemérito vizelense, deram o seu nome a uma rua de Vizela, que se inicia no cruzamento da Rua da Cruz Caída, com a Rua da Saudade, até pouco depois da Rotunda da Senhora dos Milagres, até ao limite da Freguesia de S. João das Caldas com Santa Eulália de Vizela, no cruzamento da Rua do Paço de Gominhães e Rua da Venda.
JÚLIO CÉSAR FERREIRA